Desde que foi implantado o sistema de cotas sociais, muito tem se discutido sobre o tema. Muitos acham que os sistema seja justo e que com o tempo mostrará sua eficácia no aumento do acesso das classes menos favorecidas às vagas das universidades . Existe, porém um perigo que corre em paralelo e que tem passado quase despercebido, que é o aumento do número de estudantes com boas condições financeiras nas escolas públicas de ensino médio.
O sistema de cotas representa, definitivamente, uma conquista e nasceu de uma vontade legítima de se fazer justiça social. A ideia é promover a redução das diferenças sociais, com a oferta de oportunidades para estudantes carentes. Por razões históricas, o público que mais necessita dessa oportunidade são estudantes das classes C e D, fortemente representados no Brasil por pretos, mulatos e pardos em geral.
No Brasil é assustadora a diferença das oportunidades oferecidas para pobres e ricos quando o assunto é educação. De um lado temos famílias com condições de investir na educação de seus filhos desde as primeiras séries e de outro, milhares de famílias que contam apenas com o precário aparato do ensino público. Esse desnivelamento acontece ao longo de todo o ensino, mas afeta de forma mais pesada os menos favorecidos nas últimas séries do ensino fundamental, ao final do qual as famílias têm que tomar decisões importantes para o futuro dos alunos. Por um lado, esses estudantes podem continuar na rede pública e correr o risco de ficarem mal preparados para os vestibulares ao final do 3º médio, ou podem tentar a sorte nos vestibulinhos, que são provas de admissão para o ingresso nas melhores escolas técnicas do país, tais como Colégio Técnico de Campinas (Cotuca), Colégio Técnico de Limeira (Cotil), as ETECS (Paula Souza) e dezenas de outras instituições que oferecem vagas através de provas. Em algumas dessas escolas a concorrência se equipara com a dos melhores vestibulares e chega a 30 ou 40 candidatos por vaga.
Para encarar a dificuldade de passar por essas provas, muitos pais recorrem aos pré-vestibulinhos, que são cursinhos preparatórios específicos. O problema é que esses cursinhos em geral são caros e outros só são oferecidos em grandes centros ou cidades maiores. Segundo Débora Cristina Ferro, sócia do Cursinho Genesis (Genesis Cursos), com unidades em Santa Bárbara d’Oeste e Americana, o número de alunos com boas condições financeiras que têm frequentado seu cursinho cresceu quase 300%, porque os pais estão preocupados em oferecer condição de igualdade entre seus filhos e os cotistas, por ocasião dos vestibulares.Isso representa uma inversão de valores, destaca Débora. Na verdade, as cotas viraram uma grande fonte de preocupação para os pais com filhos nas escolas particulares, pois seus filhos precisam de muito mais nota para serem aprovados nas mesmas provas que os cotistas. Colocar os filhos nas melhores escolas públicas de ensino médio, profissionalizantes ou não, virou um grande negócio que traz vantagens. Ainda segundo Débora Ferro, a maioria das aprovações de alunos nas universidades públicas estaduais e federais têm vindo de alunos cotistas e isso tende a se acentuar com o aumento da oferta de vagas sociais. No Cursinho Genesis, a aprovação dos alunos das classes C e D aumentou quase 100%, principalmente em cursos de maior demanda, como medicina e engenharias.
Pensando em resolver o problema, ou pelo menos oferecer alguma ajuda, uma startup, o Vn10 vem despontando como uma promessa para os alunos do nono ano, especialmente aqueles de cidades não atendidas pelos cursinhos, ou de regiões menores. Originalmente o Vn10 nasceu VestibulinhoNota10 em 2013 e tem como proposta ajudar estudantes pobres a se prepararem para as provas. Segundo Evandir Pereira da Silva Júnior, CEO do Vn10, no início eram apenas uns poucos estudantes, tentando se preparar para as provas, porém as coisas têm mudado rapidamente: “hoje temos alunos de todas as classes sociais acessando o Vn10 e todos com o mesmo foco, que é a conquista de uma vaga em uma escola pública de qualidade”.
Em 2016 o vestibulinhoNota10 (Vn10) foi vendido para um fundo estrangeiro de investimentos, que pretende que o mesmo seja transformado em um grande negócio com responsabilidade socioambiental e que seja oferecido para milhares de estudantes em preços reduzidos. Segundo Evandir, é possível oferecer um curso de excelente nível, com um preço justo, de modo que a manutenção da plataforma seja sustentável. “Não temos a intenção de ganhar dinheiro, ou de elitizar nosso serviço, o que queremos é provar que é possível ter o melhor de dois mundos, educação de qualidade e preço justo”. Com o Vn10 os estudantes podem estudar em suas casas, na hora que puderem e têm acesso aos melhores conteúdos, criados por professores especialistas. Na plataforma os alunos podem assistir a vídeo-aulas, participar de simulados online e ainda postar suas dúvidas nos fóruns do curso.
Os números do Vn10 já inspiram respeito: são 15 pessoas trabalhando exclusivamente na plataforma, sendo 06 deles professores de diversas áreas e quase 500 alunos acessando a plataforma. “Para 2019 queremos duplicar o número de acessos e vamos oferecer mais recursos, que vão nos aproximar mais de nossos alunos. Queremos que o aluno tenha a experiência de uma escola completa, online em sua casa 24 horas por dia”, finaliza Evandir.
A discussão sobre o assunto da justiça ou não do sistema das cotas ainda vai longe, porém é consolador saber que existem iniciativas como essas que têm tentado ajudar a todos os estudantes, independente de sua classe social.